
As decisões de abril

Face aos recentes acontecimentos na arena política internacional no mês de abril, este artigo destacará dois assuntos distintos, porém, com importantes repercussões para nós, cidadãos portugueses, europeus e civilizados, face às implicações que poderão advir para o projeto europeu tal como o conhecemos e, acima de tudo, pelo que possa significar para nós enquanto sociedade globalizada, laica e democrática.
“Esta é a primeira vez na História da Turquia que o povo turco aprova mudanças constitucionais tão importantes. No passado, era o parlamento que decidia aprovar ou não alterações constitucionais mas hoje, pela primeira vez, a vontade do povo foi manifestada.” Foi assim que Recep Tayyip Erdogan reagiu, ao cair da noite do dia 16, assim que foi noticiada a vitória no referendo para alterar a Constituição. O “sim” alcançou 51% dos votos, perdeu em Istambul, em Ancara e em Izmir, as principais cidades turcas. Pedia-se aos turcos para aprovarem ou rejeitarem “um novo projeto de constituição” que agora representa a ausência de controlos sobre o poder de Erdogan e que, a partir de 2019, será, simultaneamente, chefe de Estado e chefe de Governo, detendo ainda total poder sobre os tribunais. No poder há 14 anos, Erdogan poderá por lá continuar até 2029. As perspetivas do país aderir ao bloco europeu são, neste momento, remotas, após os eventos mais recentes que vieram azedar as relações. O Conselho da Europa afirma que “o espaço de debate democrático diminuiu após o levantamento militar” do ano passado e os deputados europeus apelam à suspensão das conversações para a adesão.
O atual Presidente turco chegou ao poder prometendo a liberalização económica e política. No entanto, consolidou o poder pessoal, purgou os rivais e suprimiu a dissidência. O homem forte do Médio Oriente habilmente mobilizou o eleitorado da periferia em prol de um interesse comum, sob uma doutrina demagoga em torno da estabilidade do país. E o povo, democraticamente, abriu-lhe caminho para um futuro que de democrático nada tem. Na história centenária da Turquia republicana, Erdogan foi o político que mais procurou fazer com que a periferia começasse a desempenhar um papel importante na economia e na política do país e, essa mesma periferia, pouco educada e bastante afeta à religião, retribui-lhe, considerando que o Ocidente não é o caminho e que um Estado secular não é o futuro.
Por fim, não poderia deixar de abordar as eleições presidenciais francesas, que depois de uma primeira volta disputada por 11 candidatos, se disputarão agora por Marine Le Pen e Emmanuel Macron. Para os europeus, que ainda se debatem com os efeitos do Brexit, o que advir desse resultado poderá ter consequências ainda mais relevantes do que no caso do Reino Unido. No país da igualdade, da liberdade e da fraternidade, Marine Le Pen optou pelo mote de campanha “França para os Franceses” para a primeira volta e “Escolher a França” para a segunda (este obviamente menos xenófobo) e colocou em cima da mesa a rejeição dos tratados comerciais internacionais e a impossibilidade de legalização aos migrantes em situação ilegal. Porém, após uma campanha “fraquinha” e vazia de conteúdo, dificilmente Le Pen chegará ao Eliseu. Macron poderá não ser o mais-querido, mas Le Pen é, certamente, a mais abominada. E, talvez por isso, Macron tenha adotado agora o mote “Juntos, França!”, numa derradeira estratégia de apelo ao voto útil.
Por: Raquel dos Santos Fernandes*.
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