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Luís Rosa

O lado “Smart” das eleições americanas

Novembro 27, 2020 em Atualidade, Concelho, Cultura, Mundo, Opinião Por barcelosnahorabarcelosnahora
Luís Rosa

Poderá o leitor questionar-se como é que as eleições nos Estados Unidos da América (EUA) são um exemplo de Smart City, se formos rigorosos e obedecermos à risca a proporcionalidade, uma Smart Nation. Desde a organização das campanhas dos partidos que vão a sufrágio até ao dia das eleições, podemos encontrar muitos contextos que se encaixam na matriz que compõem as Smart Cities. Para tal evidenciar, muitas peças jornalísticas e trabalhos científicos têm contribuído para compreender como um país da dimensão dos EUA consegue, de uma forma rápida, segura e transparente, nomear um presidente de 4 em 4 anos. Há quem resuma tudo no facto dos americanos levarem muito a sério o funcionamento das instituições, herdado da primeira constituição, mas à luz das conclusões de muitos investigadores, atualmente, já não é só o capital humano que conta, a tecnologia tem cada vez mais protagonismo.



É complicado mencionar todos os cenários que compõem uma Smart Nation dentro da logística necessária para montar todo o processo eleitoral americano. Vou escolher aqueles que mais me chamaram atenção: o impacto das redes sociais e das tecnologias virtuais na campanha eleitoral e as alternativas para exercer o ato de votar. Comecemos pela primeira.

Para compreendermos melhor o impacto das redes sociais e como se tornaram ferramentas úteis aos candidatos a ocupar a Casa Branca, é preciso analisarmos o seu desenvolvimento recente como meio de transmissão de informação às massas sem pôr em causa a legitimidade do discurso político. O primeiro registo foi em 2008 com a eleição de Barack Obama, que o mundo assistiu, pela primeira vez, ao impacto destes meios de comunicação na política e os resultados foram bastante positivos. Com a célebre frase “Yes, we can” e muita campanha através do mundo virtual, o candidato democrata conseguiu alcançar, não só, o eleitor americano, mas grande parcela da população mundial com o seu discurso otimista, jovial, bem humorado e, acima de tudo, próximo da realidade do “cidadão comum”.

Mas se a primeira impressão foi positiva, a influência das redes sociais rapidamente alavancou o surgimento de outro tipo de movimentos. Se no caso de Obama, a tecnologia foi fundamental para levá-lo ao Poder; a Primavera Árabe foi a primeira prova de que a tecnologia também pode ser fundamental para tirar o Poder de alguém. E foi com esse sentimento de retirar poder às elites que surgiu Occupy Wall Street em 2011, um movimento de protesto contra as desigualdades económicas e sociais causadas pelo setor financeiro, responsável pela crise económica mundial de 2007/2008.

Cinco anos depois, em 2016, surgiu Donald Trump, um empresário que, como político, conseguiu agregar, não só, o sentimento de revolta da população com as elites políticas e económicas, mas, principalmente, a espetacularidade mediática e a capacidade publicitária em torno da sua própria figura.

Já no rescaldo das eleições deste ano, a empresa Socialbakers, focada em investigar as tendências nas redes sociais, afirma que estas plataformas desempenham um importante papel na corrida presidencial norte-americana. O relatório destaca que Donald Trump e Joe Biden investiram elevadas quantias de dinheiro para as estratégias nas redes sociais. E indica que 72% dos cidadãos americanos com idade para votar usam, ativamente, as redes sociais, sendo que 69% deles utilizam apenas o Facebook como fonte principal de notícias. Durante a campanha eleitoral, 70% dos utilizadores adultos eram democratas e apenas uma minoria publicava regularmente o seu próprio conteúdo. Podemos achar que não há qualquer novidade nestes dados, mas se puxarmos a fita do tempo para 30 ou 40 anos atrás, concluímos que a tecnologia já não é um meio, mas um fim. Ela, não só, aproximou como acelerou a propagação dos discursos, principalmente, junto do eleitorado mais indeciso, sem que as máquinas de campanha tenham necessidade de evocar os media tradicionais como a CNN, FOX, ABC ou a NBC. Aliás, ironia das ironias, estes canais de comunicação também começaram a utilizar estes novos meios de comunicação para divulgarem as suas peças jornalísticas e os diretos, a velha máxima sempre presente “Se não podes vencê-los, junta-te a eles”. Assim sendo, se em 1992, o tabloide The Sun gabou-se de ter “vencido” as eleições no Reino Unido para o Partido Conservador, que estava em situação delicada na disputa com os trabalhistas, não será que a rede social mais popular do mundo não fez o mesmo no triunfo de Trump em 2016?

Não menos impressionante, são os diferentes tipos de votação disponíveis e a contagem dos votos em tempo recorde. De facto, só uma máquina muito bem oleada é que pode evitar cenários fraudulentos e pôr em causa os resultados numa das democracias mais antigas do mundo. Tudo isto é possível apenas porque, por tradição, o povo americano valoriza as instituições e deposita confiança em quem as lidera. Qualquer falha seria uma ferida no orgulho norte-americano e uma vergonha internacional.

No que toca aos métodos de votação a nação é maioritariamente analógica. Segundo a Fundação Verified Voting, apenas 6 dos 50 estados norte-americanos utilizam sistemas totalmente eletrónicos: Arkansas, Carolina do Sul, Delaware, Geórgia, Louisiana e Nevada. Mas os estados do Colorado, Havaí, Oregon, Utah e Washington realizam toda a sua votação via correio. Curiosidade, devido à pandemia, estima-se que 77% dos 180 milhões de eleitores americanos estejam elegíveis para votar pelo correio. Nos restantes, ainda são utilizados o papel ou sistemas mistos que envolvem o voto no boletim, que é depois validado por um aparelho que regista os votos ou então contados manualmente.

A complexidade da contagem aumenta quando as autoridades de cada estado têm autonomia para definir as regras, desde o horário da votação até o método utilizado para registar os votos, incluindo a definição dos candidatos que aparecem nos boletins de voto. Em 2016, por exemplo, além da democrata Hillary Clinton e do republicano Donald Trump, apenas Gary Johnson, do Partido Libertário, estiveram nos boletins dos 50 estados e na capital dos EUA. Aliás. Foi a primeira vez, desde 1996, que um candidato de um terceiro partido apareceu nos boletins em todo o país.

Porém, vozes como a do Richard L. Hasen não faltam. Este professor de direito na Universidade da Califórnia, no seu livro “Dirty Tricks, Distrust, and the Threat to American Democracy”, sugeriu que os EUA deveriam implementar o registo automático para todos eleitores elegíveis a partir do cartão cidadão que seria também usado para votar. Além disso, especialistas dizem que o país se deveria juntar a outras democracias mais avançadas e adotar, por exemplo, um sistema centralizado para gerir as votações. Por outro lado, especialistas em segurança eleitoral das universidades Harvard e Stanford, além de membros do Think tank Brennan Center for Justice, recomendaram a eliminação gradual da plataforma de votação eletrónica. Tudo isto são sinais de que ainda existe dentro da sociedade americana, alguma desconfiança na segurança e transparência destes sistemas, motivando a resistência à mudança. Contudo, faço o seguinte desabafo, será que o país de origem das principais empresas de tecnologia do mundo, como Google, Apple e Microsoft não é capaz de criar um sistema de votação eletrónico 100% fiável? Esperemos pelas eleições 2024 para ver se existem novidades (tecnológicas)…

Projetos Smart City interessantes para conhecer:

  • No Minho – A Cientista Agricola: projecto focado na agricultura sustentável – A agrónoma Rosa Moreira criou o projeto “A Cientista Agrícola” para falar de agricultura e assuntos relacionados de forma acessível para que todos possam conhecer melhor o setor. Natural da Póvoa de Varzim já conta com vários seguidores nas suas redes sociais, nomeadamente no Instagram ou no Youtube. Deixe-se influenciar e promova uma agricultura mais amiga do ambiente.
  • Em Portugal – Feira do Fumeiro de Montalegre 2021 será totalmente online – A Câmara de Montalegre criou uma plataforma digital que permitirá aos produtores de fumeiro de Montalegre a venda dos seus produtos, e aumentarem os canais de distribuição neste ano marcado pela pandemia de COVID-19. Será uma experiência interessante a migração da tradicional feira para um ambiente virtual.

Fonte da Imagem de destaque: https://www.financebrokerage.com/pt-br/o-resultado-eleitoral-arrisca-a-recuperacao-nos-eua/

Por: Luís Rosa*

(* A redação do artigo de opinião é única e exclusivamente da responsabilidade do autor)

App StayAway Covid: fazer Cidadania em tempo de pandemia

Outubro 27, 2020 em Atualidade, Concelho, Mundo, Opinião, Saúde Por barcelosnahorabarcelosnahora
Luís Rosa

Durante as últimas semanas evitei falar da aplicação móvel (ou abreviação inglesa app) mais famosa do país. Na generalidade, a opinião pública está impaciente, resultante das restrições, dúvidas e incertezas à volta da pandemia. Mais do que nunca, na internet e nas fontes de informação tradicionais circula muita (des)informação, por vezes, de origem duvidosa, com perspetiva de venda e consumo imediato sem ter a preocupação com quem vai consumir essa informação. Como se não bastasse, o governo apresenta esta inovação tecnológica com as melhores das intenções, mas teve pouco cuidado na comunicação do verdadeiro potencial da app e, consequentemente, gerou reações opostas às desejadas.



Imaginando que o povo português esteja baralhadíssimo sobre como se posicionar perante a app e de forma a colocar de parte todo o ruído, vou apresentar as vantagens da aplicação, as suas implicações práticas e as barreias à sua adoção.

Quem desenvolveu a app?

O projeto foi promovido pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), no âmbito da Iniciativa Nacional em Competências Digitais e.2030, Portugal INCoDe.2030 e contou com o apoio da Imprensa Nacional-Casa da Moeda (cedência do alojamento de parte do sistema), do Centro Nacional de Cibersegurança (acompanhamento do desenvolvimento e testes de segurança), a NOS (dispositivos móveis para experimentação e teste) e a Wavecom (equipamento e apoio na experimentação e teste Bluetooth) de dados.

A app StayAwayCovid foi desenvolvida por uma equipa de investigadores, coordenada pelo Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência (INESC TEC), com o apoio do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), contou ainda com a participação das empresas Keyruptive e Ubirider. De engenharia 100% portuguesa, a conceção desta aplicação móvel para rastreio rápido e anónimo das redes de contágio por COVID-19 em Portugal teve como base as apertadas legislações, europeia e nacional, de proteção de dados.

Que tecnologias utiliza a aplicação?

A aplicação utiliza a tecnologia de baixo consumo, o Bluetooth (em inglês, Bluetooth Low Energy). Este tipo de tecnologia existe desde 1998 e é usada para ligar smartphones, auriculares, colunas, consolas ou ao carro, por exemplo, e permite que aparelhos troquem informações quando estão próximos. Além da conectividade de baixo consumo, ela utiliza a tecnologia Wifi ou dados móveis. Com versões para iOS e Android, Rui Oliveira, coordenador do projeto StayAway COVID, explica que a aplicação em si não usa georeferenciação. No entanto, nos dispositivos com o sistema operativo Android, o Global Positioning System (GPS) é ligado automaticamente quando se liga o Bluetooth, pelo que cabe ao utilizador ter o cuidado de não permitir que outras aplicações acedam à sua localização.

Como funciona a aplicação?

A app StayAway COVID informa os utilizadores que estiveram no mesmo espaço de alguém infetado nos últimos 14 dias com o novo coronavírus. Para que isso ocorra, ela deteta a proximidade física entre smartphones com ajuda do Bluetooth. Esta tecnologia é responsável por difundir e receber, apenas e só, identificadores aleatórios de dispositivos próximos. Posteriormente, a aplicação armazena-os, bem como, a potência do sinal (para calcular a distância), a data e a duração estimada do contacto. Adicionalmente, não obriga a manter o WiFi ou dados móveis ligados em permanência, basta que aceda à internet pelo menos uma vez por dia – acede ao servidor público alojado em Portugal, na Imprensa Nacional Casa da Moeda.

Quais são as limitações da aplicação?

Existem várias limitações ao nível da aplicação e do “sistema”. A nível da aplicação, esta realmente só funcionará se estiver sob o alcance de um outro dispositivo a executar a aplicação, caso contrário, fica sem efeito o objetivo da app. Apesar de ainda estarmos nos primeiros meses do seu lançamento, o número de utilizadores que aderiram, infelizmente, está aquém das expectativas. Outra limitação, mas alheia à entidade que a desenvolveu a aplicação, o sistema operativo Android obriga a utilização do serviço GPS quando se liga o Bluetooth. Contudo, Rui Oliveira prevê que “na próxima versão do Android essa separação entre a utilização do Bluetooth e os serviços de GPS será feita”.

Por sua vez, ao nível do “sistema” existem vários entraves. Por exemplo, parte da população portuguesa (cerca 20%) não tem qualquer aparelho que seja capaz de instalar a aplicação. Se somarmos as crianças entre 0 e os 10 anos, cujos psicólogos sugerem que esta faixa etária não deve ter contacto com smartphones, e o grupo de pessoas com mais de 70 anos sem literacia digital que permita manuseá-la, temos mais de 2 milhões de portugueses inaptos para utilizar este tipo de ferramenta. Isto significa que teremos de fora mais de 40% da população portuguesa e, consequentemente, será difícil de ser exequível, afirmou o Professor Catedrático na Universidade do Porto, Luís Filipe Antunes, a convite da SIC. Adicionalmente, o lento rastreamento da população está a colocar potenciais infetados no meio das pessoas saudáveis. Após o teste à COVID-19, caso dê positivo, o médico faz gerar um código para que o infetado coloque na aplicação. O tempo entre recebimento desse código, a sua inserção na aplicação e a notificação a outros utilizadores poderá ser demasiado longo, tirando o efeito preventivo da aplicação.

Quais são as vantagens da aplicação?

Comparativamente a outras aplicações populares, a app StayAway Covid não exige mais do que 5 permissões (veja quais são aqui:  https://bomdia.uk/a-propagacao-da-propaganda/). Contudo, o responsável do projeto não deixa de apelar “Como cidadãos, temos de ter atenção a todas as permissões que nos são pedidas (…) Tenha atenção, não à StayAway Covid, mas a todas as outras aplicações – de mapas, de fotografia ou de redes sociais que tem instaladas, que podem efetivamente usar a georeferenciação”. A nível social, ao utilizarmos a aplicação, principalmente em recintos fechados, estamos a fazer cidadania. Infelizmente, em tempo de pandemia não são aconselhadas aproximações físicas, no entanto, a app ajuda a manter ativo o espírito solidário e de interajuda tão característica dos portugueses. Não menos importante, sendo uma aplicação inovadora e pioneira em Portugal (existem outras semelhantes no estrangeiro), pode ser o “calcanhar de Aquiles” para ideias do género no futuro, aperfeiçoadas a partir das limitações e das falhas do presente.

A app vai contra a privacidade dos utilizadores?

Vou usar a resposta do jornalista da SIC, Lourenço Medeiros, no seu artigo sobre a StayAway Covid: não, mas a obrigatoriedade do uso sim. Aliás, a Comissão de Proteção de Dados colocou como condição para o seu parecer que o uso fosse facultativo. Além disso, esta aplicação depende de autorizações da Google (versão Android) e da Apple (versão iOS) sujeitas a condições que dificilmente as duas empresas aceitariam a obrigatoriedade da instalação.

Apesar de ser contra a obrigatoriedade da aplicação, não tenho problemas em assumir que desde o primeiro dia a instalei e a uso quando estou num café, num bar ou num restaurante com amigos ou família. Olhando para as reações das pessoas nas redes sociais ou na comunicação social, as que estavam dispostos a usar, dizem agora que se as obrigarem é que não usam mesmo, sentindo-se invadidas na sua privacidade.

Finalizo este artigo parafraseando o Lourenço Medeiros: “E tudo isto é triste e grave porque a aplicação é, de facto, uma arma importante se tivermos a noção de que o seu uso faz parte de um dever cívico. Basta que uma só vida seja salva para que tenha valido a pena este pequeno gesto gratuito, que não nos retira rigorosamente nada”.Portanto, apela-se aos portugueses que façam Cidadania em tempo de pandemia.

Projetos Smart City interessantes para conhecer:

Por: Luís Rosa* (Membro e Investigador no Synthetic Intelligent Lab do Centro ALGORITMI – Universidade do Minho).

(* A redação do artigo de opinião é única e exclusivamente da responsabilidade do autor)

Foto: DR.

Desde a Idade da Pedra até às Smart Cities

Outubro 9, 2020 em Atualidade, Concelho, Economia, Mundo, Opinião Por barcelosnahorabarcelosnahora
Luís Rosa

Caros Barcelenses, é com enorme satisfação que sou o novo membro da equipa de cronistas que compõe o jornal online Barcelos na Hora. Agradeço, publicamente, ao diretor do jornal, Pedro Soares de Sousa, por me dar esta oportunidade e, desde a primeira “Hora”, mostrar entusiasmo quando lhe propus este novo “espaço”.



Fui formado por uma das melhores academias do país, a Universidade do Minho, em Engenharia Informática. Apesar de exercer a profissão numa empresa multinacional americana, desde 2018 que decidi voltar ao mundo académico e sou doutorando/investigador no Intelligent Systems Lab do Centro ALGORITMI – Universidade do Minho na área das Smart Cities. A minha formação académica e a minha experiência profissional permitem-me abordar temas atuais como Cidades Inteligentes, Inteligência Artificial, Big Data, etc. e naturalmente, lhes darei destaque nos meus artigos.

Como qualquer outra área científica, a tecnologia é um elemento “vivo”, que foi tendo, ao longo da existência da humanidade, diferentes funções e evoluções como algo inacabado. Basta ver desde a Idade da Pedra, da época Medieval, passando pela revolução industrial até à revolução industrial 4.0 (a nossa era) de como a tecnologia e o homem andaram sempre de “mão dada”. Para confecionar os alimentos, começamos a usar o fogo, a partir da utilização de pequenos utensílios, milhares de anos depois, começamos a usar ferramentas sofisticadas para defender os nossos territórios ou comunidades, com a introdução do motor foi possível substituir o homem em trabalhos repetitivos. Chegamos ao ano 2020 e comunicamos por videoconferência com alguém que está noutra zona do globo e, com certeza, a evolução tecnológica não vai parar por aqui. Por esta razão, é fácil imaginar que os artigos em que irei enquadrar os tópicos acima apresentados poderão até estar, à hora da publicação, desatualizados. A tecnologia, sendo um parceiro do homem, tem que estar sempre a ser (re)desenhada na resolução dos problemas que ele enfrenta no dia a dia.

Por outro lado, as cidades estão a tornar-se cada vez mais atrativas, o que leva a um crescimento acelerado da população nas zonas urbanas. Segundo a Organização das Nações Unidas, atualmente, 55% da população mundial vive em áreas urbanas e a expectativa é de que esta proporção aumente para 70% até 2050. Sem dúvida que, gerir as cidades, será cada vez mais desafiante e, paralelamente, obrigará a uma maior democratização da parte delas. Por outras palavras, será conveniente uma maior participação da comunidade na construção de uma cidade sustentável e exige-se às instituições locais (autarquias) uma maior transparência e celeridade na tomada de decisões e na resolução dos problemas dos seus conterrâneos. Desta forma, para que estas duas premissas se cumpram o uso da tecnologia, torna-se útil, falamos, pois, em tornar as nossas cidades inteligentes (em inglês, Smart Cities).

A definição de Smart Cities não é consensual. Num artigo que propõe caminhos de inovação na gestão dos serviços públicos, Jean Hartley considera uma cidade inteligente aquela que liga infraestruturas físicas, infraestruturas sociais e os negócios para alavancar a inteligência coletiva. Por sua vez, o britânico Robert Hollands, professor de sociologia na Universidade de Newcastle, defende que são territórios com alta capacidade de inovação, que se constrói a partir da criatividade da sua população, instituições académicas e boas infraestruturas de comunicação. Porém, a União Europeia estabeleceu uma classificação de Smart Cities através de seis grandes pilares (ver a Figura). Cada pilar agrega um conjunto de indicadores que podem ser usados para medir a inteligência de uma cidade. A partir deles, será possível avaliar o nível de sucesso na transformação para uma Smart City. Os pilares e respetivos indicadores, são: Smart Mobility, Smart People, Smart Economy, Smart Environment, Smart Governance e Smart Living.

  • Smart Mobility – É um dos principais pilares de uma Smart City. Baseia-se no uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) para apoiar e integrar sistemas de transporte e logística de maneira a que a mobilidade se torne mais eficiente e eficaz. Esta plataforma inclui carros, aviões, comboios, bicicletas e até peões. Os seus indicadores são a boa acessibilidade local (nacional e internacional); boas infraestruturas TIC e transportes seguros, inovadores e sustentáveis.
  • Smart People – Pessoas participativas são fundamentais nas cidades. Os cidadãos devem adquirir e-skills, tudo dentro de uma comunidade inclusiva que contribua para a criatividade e a inovação. Além disso, a cidade atingirá bons níveis de inteligência se os seus habitantes forem incentivados a manipular aplicações tecnológicas (por exemplo, personalização dos dados para as tomadas de decisão), ou a criar novos produtos e serviços. Alguns indicadores são a pluralidade social e ética, a criatividade, o nível de formação profissional e a participação cívica.
  • Smart Economy – É a transformação da economia. Os seus principais objetivos são o aumento da produtividade, e-business e/ou e-commerce. Inclui, também, a produção e prestação de serviços com suporte tecnológico, como formas de melhorar a economia usando aplicações rápidas e confiáveis. Os indicadores para analisar este pilar são a produtividade, flexibilidade do mercado de trabalho, o empreendedorismo, o espírito inovador e a capacidade de transformar.
  • Smart Environment – É o pilar mais popular. Refere-se às políticas dirigidas para gerir o ambiente. Visa o incentivo à utilização de energias renováveis, medição, controlo e monitorização da poluição, gestão eficiente dos edifícios e o planeamento urbano verde. Portanto, os seus indicadores são a gestão de recursos sustentável, níveis de poluição, proteção ambiental e a eficiência no uso (reutilização e preservação) de recursos diversos.
  • Smart Governance – É o pilar mais delicado de todos. Apela-se a quem governa a nível local, que seja politicamente cuidadoso e sensível. Além disso, obriga a uma articulação entre diversas entidades a três níveis distintos: com os cidadãos, com governos de outras cidades (dentro da mesma região ou país) e com o governo central. Não menos importante, para uma governação eficiente e eficaz é necessário que as forças vivas da cidade (sector privado, público, civil e organizações nacionais) interajam mutuamente. Esta partilha institucional pode chegar ao nível tecnológico. Boas infraestruturas TIC, hardware e software adequado possibilitam a intensificação das parcerias entre as diferentes entidades. Por exemplo, é do máximo interesse dos cidadãos saberem as zonas onde o tráfego rodoviário é mais intenso e sugerir alternativas que facilitem a deslocação até ao destino. Portanto, é crucial, também, envolver os cidadãos. Os parâmetros que permitem avaliar este pilar são a participação dos cidadãos nas tomadas de decisão, a interação de serviços públicos e privados, uma governação transparente e as estratégias politicas.
  • Smart Living – A tecnologia torna o estilo de vida das pessoas mais confortável. Este pilar tem impacto nos hábitos sociais e afeta o comportamento dos cidadãos, tornando-os mais capacitados. Não menos importante, o feedback dos cidadãos é visto como algo importante para o governo da cidade. Além disso, refere-se também a uma vida segura e saudável, com diversos equipamentos culturais, e incorporando habitação de boa qualidade. Assim sendo, os indicadores que se destacam são a segurança, as condições de saúde, a qualidade de habitação, equipamentos educativos, atrações turísticas e coesão social.

Estes pilares são centrais para que uma cidade seja considerada verdadeiramente uma Smart City. Contudo, nem todas as zonas urbanas apresentam os mesmos recursos devido às suas caraterísticas e prioridades para o cidadão e/ou serviço público. Considera-se, assim, que uma cidade é Smart City mas apenas no respetivo pilar, ou pilares, adotado.

Smart City (Imagem: DR)

Espero que esta introdução às Smart Cities abra o apetite ao leitor sobre os diversos assuntos que irei abordar no futuro. A par disso, farei questão de partilhar projetos que os stakeholders, desde da área pública, privada até a sociedade no geral, desenvolvem para transformar as cidades em espaços mais sustentáveis e inteligentes. Não querendo, já, desvendar o tema do próximo artigo, fique atento à pista, até lá, stay away COVID.

Projetos Smart City interessantes para conhecer:

  • Em Barcelos Mapeamento Artístico e Cultural de Barcelos – O Município de Barcelos está a promover a plataforma “Mapeamento do Setor Artístico-Cultural” que consiste no levantamento da comunidade artística barcelense através de uma plataforma digital de recolha de dados. Caso seja do seu interesse, participe.
  • No Minho – O maior projecto de gestão de estacionamento está em Guimarães – A Câmara Municipal de Guimarães vai usar uma plataforma de gestão inteligente da Ubiwhere, que permitirá o controlo do estacionamento em avenidas e locais públicos, incluindo lugares de estacionamento de superfície. Vale a pena acompanhar este projeto, é aqui ao lado…
  • Em Portugal – Portugal organizou a Smart Cities Tour – Este projeto é desenvolvido pela Associação Portuguesa de Municípios Portugueses e a NOVA Information Management School, com os parceiros do mundo empresarial Altice Portugal, CTT e EDP Distribuição. Estão lançadas as bases para as cidades tornarem-se mais inteligentes.
  • No Mundo – A cidade de Palmerston focada na segurança dos cidadãosEsta cidade australiana usa a tecnologia inteligente para tornar a comunidade mais segura e habitável. Mais uma vez, a tecnologia torna-se um parceiro indispensável.

Por: Luís Rosa* (Membro e Investigador no Synthetic Intelligent Lab do Centro ALGORITMI – Universidade do Minho).

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